Relatório do Insper e da Universidade de Sussex (Reino Unido) de janeiro de 2025 compila recomendações para aprimorar o debate sobre regulação de plataformas de internet no Brasil. Segundo os especialistas que colaboraram com o documento, o Marco Civil da Internet (lei 12.965 de 2014), discutido no STF (Supremo Tribunal Federal), necessita ser atualizado. Eis a íntegra (PDF – 441 KB).
As recomendações foram dadas por 28 especialistas do poder público, da academia, da iniciativa privada e da sociedade civil em novembro de 2024, durante um debate sobre os desafios relacionados ao avanço da discussão regulatória.
Diversos participantes da oficina que originou o relatório apontaram para a necessidade da atualização ou de uma "construção de camadas" sobre o norma, considerando os novos modelos de negócio das plataformas e os riscos sistêmicos que vieram com a transformação da internet desde 2014.
Exemplos de riscos são a disseminação de desinformação e de discursos de ódio. Segundo os especialistas, ambos foram amplificados por algoritmos de recomendação e impulsionamento pago de conteúdo. Além disso, por influenciadores digitais com grande alcance e com a dificuldade de marcos regulatórios "pré-digitais" (tais como a legislação eleitoral) também impulsionam a disseminação.
O uso da audiência nas redes e de técnicas de marketing digital pelo ex-coach Pablo Marçal (PRTB) foi utilizado no estudo para ilustrar a questão. O político quase garantiu um lugar no 2º turno da disputa pela Prefeitura de São Paulo em 2024.
RESPONSABILIZAÇÃO DAS PLATAFORMAS
A responsabilidade dos provedores de aplicação de internet sobre o conteúdo gerado por terceiros também é alvo de preocupação no estudo. Ela está disposta nos artigos 18 e 19 do Marco Civil da Internet.
"O julgamento do Supremo Tribunal Federal sobre a constitucionalidade do regime de responsabilidade de intermediários estabelecido pelo Marco Civil da Internet definirá futuras trilhas deste debate", diz o relatório.
O artigo 19 está sob análise de constitucionalidade no STF por determinar que as plataformas só sejam responsabilizadas pela publicação de conteúdos de seus usuários caso desobedeçam a uma ordem judicial de remoção. Para os especialistas, o dispositivo é "insuficiente para lidar com os riscos sistêmicos".
Dizem que as sucessivas ordens judiciais de remoção de perfil de Pablo Marçal na eleição de 2024 evidenciaram a lacuna na lei, uma vez que um dos perfis criados após as remoções alcançou 1 milhão de seguidores em só 2 horas.
"É preciso que as plataformas adotem medidas preventivas, mais estruturantes e compatíveis com instrumentos de ‘devida diligência’, o que transborda o debate sobre responsabilização civil pela publicação de conteúdos de usuários", afirma o estudo.
Foi ressaltado, portanto, o papel do Estado na elaboração e articulação de uma política pública "mais sofisticada" para as plataformas digitais do que os dispositivos presentes no Marco Civil da Internet.
FISCALIZAÇÃO
Argumentou-se que a autorregulação, principalmente por meio de mecanismos de moderação de conteúdo, também tem se mostrado insuficiente para lidar com riscos emergentes.
Para os participantes da oficina, é necessária a construção de regulações mais robustas e para além do controle judicial. Um caminho apontado por alguns participantes foi a estruturação de um novo ente regulador independente para fazer a fiscalização e garantir o cumprimento de normas.
"A falta de especificidade pode gerar insegurança jurídica e prejudicar o funcionamento das plataformas esperado pela sociedade, gerando efeitos indesejados e imprevistos", afirma.
Participantes de diferentes setores deram ideias para suprir as "lacunas" das capacidades do Estado brasileiro para dar conta desse objetivo. Citam órgãos de governo recém-criados que estão em aprendizado sobre escopo e capacidades, as atuações da ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados), da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) e de um Judiciário ativo e com atuação exemplar, especialmente no âmbito da Justiça Eleitoral em razão de suas competências regulamentar e administrativa e poder de polícia.
ANÁLISE DA CORTE
O julgamento da responsabilização das plataformas de redes sociais no STF deve ser retomado em 2025 após o fim do recesso dos ministros na 2ª feira (3.fev). Ele foi suspenso em dezembro de 2024 após os votos dos relatores Luiz Fux e Dias Toffoli. O placar está em 2 a 0 pela inconstitucionalidade do dispositivo por entenderem que as plataformas devem remover as publicações antes da notificação judicial. Não há data marcada para a retomada.
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